— E então avistei a jaula — disse Heitor dando outra baforada no charuto e soltando a fumaça para cima.
— Estava bem escuro no laboratório, mas, na parte de cima perto do teto que ficava a uns seis metros do chão, havia uma espécie de mezanino, uma plataforma de observação com várias escotilhas de vidro, e uma luz fraca vinha de lá. Minha visão estava se acostumando à escuridão.
Durval estava com fome, devia ser perto de meio dia, sua hora de almoçar, mas precisava saber o que era a tal fera enjaulada no laboratório do exército que Heitor havia invadido em seus anos como tenente das Forças Armadas. Melinda, a esposa de Heitor, estava preparando o almoço e Durval concordou em ficar para comer depois do convite assertivo de Heitor. Mas, mesmo com fome, queria que ela demorasse mais um pouco até que Heitor concluísse seu relato.
— A jaula era como uma caixa retangular feita com barras de ferro reforçado — continuou Heitor. — Media cerca de dois metros de altura por mais ou menos seis metros de largura. Os encaixes das barras eram reforçados com arame e soldados por brasagem, o processo de solda mais forte que existe. A cela estava encostada na parede dos fundos do laboratório e parecia ter sido construída ali mesmo, pois a parte de baixo estava cimentada no chão e dava para ver o concreto novo de cor mais clara que o resto do piso. Ao lado da jaula havia uma prateleira e uma mesa com vários instrumentos cirúrgicos. Notei duas pistolas de dardos tranquilizantes e várias seringas, algumas ainda lacradas, outras estavam dispostas lado a lado com um líquido vermelho escuro parecendo sangue no interior.
“Dentro da jaula consegui enxergar um tipo de catre baixo que parecia ser de cimento. Em cima dele havia uma lona grossa estendida e o que parecia ser palha ou gravetos finos de mato seco.
“Olhei ao redor e não vi nada, ao que parecia a jaula estava vazia. Me aproximei tentando não fazer barulho.
“A porta da jaula tinha dobradiças de ferro que pareciam desproporcionais de tão grandes, e a fechadura, assim como a maçaneta de ferro, estavam completamente retorcidas, como se houvessem sido envergadas por uma força sobre humana. Em volta da junção da porta com as barras da lateral da jaula, haviam passado três correntes grossas com várias voltas e fechado com cadeados. Uma na parte de cima da porta, outra no meio e a terceira rente ao chão.
“Dei mais um passo na direção da jaula e fiquei bem na frente da porta. Forcei os olhos na direção do fundo da cela. Havia alguma coisa encostada na parede, mas parecia ser um monte de galhos e palha. Havia também dois fardos de feno amarrado de meio metro cada ao lado do monte. Fora isso a jaula parecia estar completamente vazia.
“Só então percebi no chão, dentro da jaula, bem próximo de onde eu estava, a criatura abaixada olhando diretamente para mim”.
Episódio XL continua na próxima edição.
JOSÉ GASPAR
Cineasta e escritor
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