Manusear a terra, plantar sementes ou mudas, regar flores, podar galhos, colher o que plantou literalmente falando. E no final, uma sensação de dever cumprido e de paz e calma ao ver que o verde à sua volta tem um pouco do seu trabalho inserido nele. A função terapêutica da jardinagem não precisa ser expressa em palavras para quem ama cuidar do jardim e da horta, mas há sim uma relação quase medicinal entre a natureza e o cuidado com ela através da jardinagem. Essa ligação entre jardinagem e terapia existe e é secular.
Uma linha de tratamento psiquiátrico baseada na cognição chamada de hortoterapia é usada desde o século XIX – reza a lenda que o pintor Vincent van Gogh, quando decidiu internar-se por conta própria em um sanatório na França, usava seu tempo livre contemplando a flora daquela região da Provença para contemplar as florestas e jardins. Essa observação deu origem a um frenesi de quadros que tornaram-se referência do impressionismo, como o famoso A Noite Estrelada.
Os preceitos da hortoterapia (adaptação do anglicismo Garden Therapy) envolvem a prática da jardinagem, fazendo com que o paciente colocasse “a mão na massa” e ocupasse a mente com uma atividade que trazia resultados práticos e que podiam ser contemplados. Antes do advento da psiquiatria como ciência, a terapia da jardinagem fazia com que pacientes psiquiátricos praticassem a interação com o ambiente que a cercava e a futura contemplação do resultado dos seus atos.
Fugindo do escopo medicinal da hortoterapia, a jardi-nagem como terapia pode ser aplicada no dia a dia cada vez mais excruciante de quem mora em centros urbanos. O concreto dos apartamentos e casas sem quintais fez com que muitos se valessem da criatividade para implementar hortas, jardins e até mesmo pomares na outrora inóspita selva de pedra. Um exemplo bastante famoso entre os amantes da jardinagem é o pomar que o cronista Rubem Braga (1913-1990) mantinha em sua cobertura em Ipanema, com jabuticabeira (Plinia truncifloria), goiabeira (Psidium guajava) e mangueira (Mangifera indica), entre outras espécies.
A jardinagem tem a capacidade de dar à pessoa que a pratica um vislumbre do papel do ser humano e dos demais seres vivos no planeta, mesmo que inconscientemente. As relações com os elementos básicos da vida (ar, água, terra), a interação e integração entre eles, uma noção de mortalidade que não nos choca mas nos remete ao nosso humilde papel no Universo, a beleza do conjunto de flores, frutos, legumes, verduras e demais plantas e a possibilidade de ouvir o canto de pássaros que buscarão o alimento e conforto do que foi plantado com suas próprias mãos. Não há nada mais terapêutico do que os simples gestos feitos com ancinhos e terra.
Fonte: www.jardinagemepaisagismo.com