— Como assim ele está entre nós? — Perguntou Durval.
— Sempre esteve, Durval! Sempre esteve entre nós — respondeu Heitor. — E não é apenas um, são centenas dessas criaturas, talvez milhares.
Você não estava ouvindo o que eu te contei? As lendas, todas as histórias e mitos sobre criaturas com chifres, como Faunos, Minotauros, demônios, todas elas tem a mesma origem.
Enquanto ouvia o relato de Heitor, Durval pensou que o ex-capitão do exército só podia estar alucinando. Aquilo não fazia o menor sentido. Tribos de homens com chifres? A lenda do Minotauro real? Durval não era um cético, mas aquilo era demais para o senhor de 76 anos de idade. Mesmo já tendo visto de tudo nessa vida, era impossível que uma raça de homens com chifres vivesse ainda hoje entre nós sem que ninguém soubesse. Por outro lado, a fotografia parecia muito real. A foto em que Botelho estava ao lado de um homem com chifres deitado em uma maca de aço e coberto com um lençol. Ao redor havia homens com fardas do exército em uma espécie de laboratório cheio de painéis com instrumentos eletrônicos. Durval não esqueceria tão rápido aquela imagem. O homem estava com os olhos fechados, dormindo ou talvez morto. Os chifres enrugados saiam da testa e enrolavam-se em volta da cabeça.
— Mas os chifres do homem da foto eram enrolados como os de um carneiro — protestou Durval. — Na lenda do Minotauro ele é metade homem e metade touro, os chifres de um touro são…
— Tem vários tipos! — interrompeu Heitor. — Você não percebe? É óbvio que não se trata de um cruzamento entre espécies! Não são metade homens, metade outro animal como nas histórias. São uma espécie ou raça diferente da nossa. Além do mais, mesmo nas lendas, eles são retratados de muitas formas. Os chifres dos Faunos são como os de um carneiro, já as fadas, em muitas histórias, são descritas com chifres pontudos e não enrolados em volta da cabeça. O deus Pan tinha chifres menores e pernas de bode, e tocava flauta como você. Essas histórias estão mescladas em todas as culturas humanas.
Por exemplo, Pan era temido por quem andava sozinho à noite, pois corria o risco de sentir um imenso terror sem causa aparente, esse medo repentino era atribuído à Pan, e é daí que vem a palavra pânico. Percebe, Durval? As pessoas da antiguidade devem ter se deparado com vários desses seres, mas cada um os retratou de uma forma e acabou incluindo detalhes fantasiosos, como asas, ou pernas de bode. Os Cavaleiros Templários o chamaram de Baphomet e Eliphas Levi o retratou como um bode demoníaco. Mas o fato é que eu vi uma dessas criaturas.
Sei do que estou falando. Tirando os chifres e os dentes pontiagudos, o rosto é bem humano, mas os olhos são diferentes…
— Diferentes como? — Perguntou Durval.
Heitor ficou ainda mais sério, olhou para baixo e pigarreou. Então inclinou-se para trás na poltrona e deu uma baforada no charuto.
— Os olhos podem hipnotizar você.
Episodio XLII continuana próxima edição.
JOSÉ GASPAR
Cineasta e escritor
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